Sexta-feira à noite, sem muito o que fazer, comecei a passar os canais na TV... Depois de algum tempo, eis que encontro um canal que estava para começar um filme que eu sequer tinha ouvido falar. Sou meio desiludido com filmes recentes, por isso não adentrei com grandes expectativas ao assistir "Enterrado Vivo", mas de qualquer modo resolvi dar uma chance a ele.
Fiquei realmente impressionado com esse fabuloso exemplo de cinema minimalista. Um filme que nos transmite sentimentos claustrofóbicos e o verdadeiro desespero daqueles que são levados ao limite da sanidade e do instinto de sobrevivência. O filme todo se passa em um caixão, em que Paul Conroy (Ryan Reynolds), um motorista de caminhão trabalhando no Iraque acaba sendo enterrado depois de seu comboio ser atacado por "terroristas" (O filme até nos proporciona outra luz sobre essa palavra). No caixão, Paul precisará sobreviver com alguns objetos "úteis": celular, isqueiro e uma faquinha. Ele consegue se comunicar com outras pessoas através do celular, inclusive com o terrorista, que solicita uma quantia em direito para libertá-lo.
Paul praticamente realiza ligações para todos os departamentos de segurança dos EUA e é perceptível a falta de interesse dos mesmos em ajudá-lo de alguma maneira concreta. Sem dúvida a burocracia é a segunda maior crítica do filme a sociedade contemporânea, em que reputações e papeladas são colocados acima da vida humana.
Não obstante, o diretor Rodrigo Cortés descreve de maneira fria os enclaves psicológicos de pessoas expostas ao extremo para sobreviver. Paul ter sido enterrado vivo (Não ter para onde se mexer) sem dúvida pode ser comparado aos próprios conflitos no Oriente Médio, onde o povo árabe acabou sendo submetido a pressões externas e sua sociedade desmantelada. Não estou do lado dos terroristas, mas uma conversa do filme realmente chamou minha atenção. Tentarei reproduzi-lá.
(Conversa pelo celular)
Paul: Por que você fez isso comigo? Eu não sou um soldado! Não tenho nada a ver com essa guerra em seu país!
"Terrorista": Eu também não tinha nada a ver com Bin Laden ou com Saddan Hussen, mas isso não impediu vocês de virem até meu país e destruí-lo...
Paul: Eu não sou um soldado!
"Terrorista": Você é americano?
Paul: Sim!
"Terrorista": Então você é um soldado...
Paul: Eu tenho dois filhos!
"Terrorista": Eu tinha cinco! Agora só tenho um!
...
O que você faria em um país destruído? Um país em que todas as pessoas que algum dia você conheceu, morreram, vítimas das atrocidades da guerra? Como você se sentiria se fosse hostilizado por um povo hostilizado por você mesmo? Ter pontos de vista diferentes realmente podem enobrecer e expandir o domínio sobre dado assunto. E Cortés conseguiu nos transmitir isso. Uma crítica construtiva sobre a brutalidade de ambas as partes. No fundo todos somos seres humanos. E quando o ser humano é colocado no limite de sua existência, percebemos o que ele realmente é capaz de fazer para sobreviver.
Ryan Reynolds nos proporciona uma das melhores atuações de sua carreira, sustentando muito bem toda a tensão inerente a uma produção desse gênero. Sendo o único ator que aparece em tela (todos os outros são apenas as vozes no celular), Reynolds cresce no decorrer da trama, demonstrando toda sua capacidade em uma atuação quase perfeita. Muitas cenas mostram dificuldades perceptíveis ao serem realizadas, e a última cena, nas palavras do próprio Ryan:"... foi uma experiência que não quero tornar a repetir.".
Rodrigo Cortés realizou uma excepcional filmagem em um espaço extremamente restrito. A maneira que ele filmou a primeira tomada fez meu intelecto virar algodão-doce. Cortés filmou uma obra de tensão claustrofóbica com críticas sociais, casada com uma sublime perícia com o câmera. Uma habilidade extremamente difícil de ser encontrada em um cineasta.
Concluo, recomendando "Enterrado Vivo" para aqueles que gostariam de se aprofundar nas mais diversas perspectivas sobre os conflitos do Oriente Médio ou os que queiram cada vez mais entender a natureza do homem.
NOTA: 8
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